sábado, 6 de junho de 2015

DA CONTEMPLAÇÃO DO CONSORCIADO

Neste texto iremos abordar o problema da negativa, muitas vezes abusiva, pela administradora de consórcio em entregar a carta de crédito, após a contemplação.

No consórcio diferentemente do financiamento o consorciado ao aderir ao contrato não passa por analise cadastral, pois é mero investidor do grupo do qual adentra, somente após a contemplação de sua cota de consórcio ele passa a condição de devedor do grupo com a disponibilização da carta de crédito que deve se dar em até três dias da contemplação. O ato da disponibilização difere da efetiva entrega da carta de crédito ao qual somente ocorrerá após satisfeitas as aprovações da analise de cadastro e garantia, bem ao qual será alienado fiduciariamente em garantia.

Os problemas começam quando o consorciado após pagar anos a fio religiosamente suas contribuições é contemplado e a administradora lhe exige, dentre outras situações, comprovação de renda em 03 vezes o valor da parcela, não ter restrição nos órgãos de restrição ao crédito, e ainda dependendo do panorama quanto ao saldo devedor, a figura do devedor solidário ou fiador/avalista.

Muitas administradoras utilizam o chamado credit score card da SERASA que apesar de ser licito passa panorama ao qual não condiz com a realidade do consorciado consumidor utilizando de fórmula respaldada em sua base de dados para aferir a credibilidade do consumidor no mercado de consumo.

Este mecanismo de aferição se traduz em prática ao qual traz prejuízos ao consumidor que por anos, conforme dito, pagou rigorosamente em dia suas contribuições e agora se vê obstado de utilizar seu crédito por prática abusiva do fornecedor de serviços.

O próprio bem por si só já deveria ser garantia, mais que suficiente, para garantir o grupo. O que se percebe é que o fornecedor cumula garantias a fim de ter maior segurança em seu negócio repassando o risco ao consorciado que acaba por não receber seu crédito, vendo frustado todo seu projeto de vida, visto que muitas vezes o consórcio adquirido é para realização do sonho da ter uma casa ou um veículo tendo o consorciado pago por anos a fio.

Quando da aquisição o vendedor lhe passa um panorama de extrema facilidade para a aquisição da carta de crédito apresentando as centenas de vantagens na aquisição do plano, entre elas a ausência de juros, taxa administrativa quase irrelevante e o prazo generoso para pagamento. O problema ocorre justamente no momento que deveria ser o ápice da concretização do sonho: a contemplação!

A grande maioria dos vendedores não apresentam detalhes sobre o momento pós-contemplação, quando muito informam que no momento da liberação do crédito (seja este por sorteio ou lance) o consorciado não poderá apresentar restrições no nome. Acabam sendo omissos em informações relevantes, como a forma de comprovação de renda ou a exigência de avalista para a utilização do dinheiro. E é sobre a (i) legalidade deste instituto que apresento-lhes neste texto.

Para começarmos segue uma definição simples de avalista:
Aval é a declaração cambial através da qual uma pessoa (avalista), se torna responsável pelo pagamento de um título de crédito nas mesmas condições de seu avalizado.”
Em resumo é alguém que garante o pagamento da dívida caso ela não seja paga pelo devedor principal.
Agora vejamos: Seria correto por parte da Administradora de Consórcio realizar somente a liberação do crédito mediante a apresentação de um avalista? Acredito que não!
Apresento um trecho do contrato de uma importante Administradora, que convenciona:
ANÁLISE DE CRÉDITO E GARANTIAS: Com o objetivo de garantir o equilíbrio financeiro do GRUPO, cabe à ADMINISTRADORA, por critérios próprios, a obrigação de fazer a análise de risco de liberação do crédito, exigir garantias e decidir sobre a aprovação do CONSORCIADO quando da utilização do crédito
A ADMINISTRADORA disponibilizará a CARTA DE CRÉDITO somente aos consorciados que não estejam com restrições cadastrais e que apresentem capacidade de pagamento compatível com o crédito contratado
Ao CONSORCIADO que não satisfizer as condições de cadastro e capacidade de pagamento, fica assegurada a contemplação, e, no momento em que reunir as condições exigidas pela ADMINISTRADORA, sua CARTA DE CRÉDITO OBJETO DO PLANO será disponibilizada
O resultado da análise de risco de crédito poderá condicionar a utilização da CARTA DE CRÉDITO OBJETO DO PLANO à apresentação de garantias em valor superior ao SALDO DEVEDOR
Para garantir o pagamento das parcelas vincendas, será exigido do contemplado cópia do comprovante de renda, CPF e RG do cliente bem como alienação fiduciária ou outra garantia real do bem adquirido, ficando a critério da Administradora garantia complementar como aval, fiança ou outra garantia real.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA: Em garantia do pagamento das parcelas vincendas, o CONSORCIADO contemplado dará em alienação fiduciária à XXXXXX CONSÓRCIOS o BEM objeto, ou seja, a propriedade do BEM será da XXXXXX CONSÓRCIOS, ficando o CONSORCIADO com sua posse e direito de uso até a quitação do débito, quando se tornará titular de sua propriedade
O CONSORCIADO poderá perder a posse e o direito de uso do BEM, caso deixe de pagar as parcelas devidas
CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE DO BEM ALIENADO: A ADMINISTRADORA providenciará, por meio judicial ou extrajudicial, a consolidação da propriedade em seu nome e a retomada do bem alienado, caso o CONSORCIADO contemplado se torne inadimplente. Uma vez consolidada a propriedade em nome da XXXXXXXX S/A - Contrato de Adesão V 1.0 Registro Nº XXXXX Página 25 de 26 ADMINISTRADORA, esta fará a venda do mesmo, destinando o valor apurado ao pagamento das parcelas em atraso, das vincendas e demais obrigações, conforme a legislação vigente”
Fica nítida as cláusulas leoninas apresentadas pelas Administradoras de Consórcio, pois vejamos:
  • Aceitam o consumidor no grupo de consórcio e arrecadam a mensalidade sem realizar qualquer prévia analise de sua capacidade financeira;
  • Ao ser contemplado o bem fique em nome da Administradora (alienação fiduciária)
  • Caso não possua a capacidade financeira adequada poderá, além da alienação fiduciária, ser solicitado fiador, avalista ou até mesmo a probição da liberação do crédito!
O contrato também é abusivo por não determinar de maneira categórica o que seria capacidade financeira para a Administradora: Ganhar duas, três, cinco vezes mais que a parcela? Declarar IRPF? Ter bens no nome? Movimentação financeira? Ter bom histórico de adimplência?
O contrato de consórcio é de consumo e o consorciado está protegido pelo Código de Defesa do Consumidor, que dentre vários artigos cabíveis ao tema, apresento:
Art. 51.São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
Diversos julgados já declararam a ilegalidade do aval para liberação do consórcio contemplado, dos quais destaco:
CONTRATO DE CONSÓRCIO TUTELA ANTECIPADA PRÁTICA E CLÁUSULA ABUSIVAS - Recusa da administradora em fornecer a carta de crédito ao consorciado contemplado O contrato, além de ser de adesão, é de consumo. Mostra-se abusiva a cláusula contratual que sujeita o consumidor, ao ser contemplado, à assinatura de contrato de alienação fiduciária, acrescido da exigência de prestação de aval e assinatura -TJ-SP - Agravo de Instrumento AI 20440598820138260000 SP 2044059-88.2013.8.26.0000
(Processo nº 001.05.030713-5/ RN - Jacileide Rodrigues Cruz x Consórcio Nacional Ford)
“[...]Na análise meritória, verifico que a autora pleiteou uma indenização por danos morais, uma vez que fora contemplada, por sorteio, no consórcio ao qual aderiu junto ao Consórcio Nacional FORD Ltda para aquisição de um veículo FORD KA 1.0 e não o recebeu, mesmo estando em dia com as parcelas, sob o argumento de haveria a necessidade de uma garantia suplementar consubstanciada em um avalista, considerando tal garantia suplementar como abusiva […]
No caso, foi imposto pela ré a existência de um avalista para entrega do bem, além da garantia da alienação fiduciária do veículo em favor da Administradora até a quitação do contrato. Essa conduta, ao meu ver, coloca o consumidor, já que estamos tratando de um relação consumerista, em extrema desvantagem, uma vez que já há uma garantia posta a viabilizar o adimplemento, qual seja, a alienação fiduciária do bem. Exigir a ré que a autora também apresente um avalista, pode tornar-se impraticável para a mesma, frustrando seu desejo de possuir um veículo automotor tão esperado há alguns anos, uma vez que além de ser uma conduta excessiva, esse tipo de garantia nem sempre é fácil de se conseguir. Preceitua o art. 51, e inciso iv, do cdc, que "são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa- fé ou a equidade". A imposição a autora/consumidora de mais de uma garantia de pagamento das prestações vincendas do consórcio, infringiu a norma estatuída no dispositivo supra transcrito (art 51IVCDC), haja vista a extrema dificuldade imposta a aquisição do bem, colocando-a em extrema desvantagem diante do fornecedor e consequentemente, desestabilizando a relação contratual entre as partes. Principalmente, em se tratando de contrato de adesão, como é o caso dos autos, no qual o consumidor não tem a possibilidade de alterá-lo, só podendo discutir a abusividade de sua cláusulas, mediante a interferência do Judiciário. Portanto, merece ser acolhido o pleito da autora, haja vista que nos autos se evidenciam a existência do dano moral, consubstanciado na expectativa frustrada da autora, diante das parcelas em dia e ter o próprio veículo como garantidor do pagamento das parcelas vincendas do consórcio, não trazendo os réus qualquer argumento modificador do direito perseguido na exordial, no que tange ao pleito indenizatório por danos morais. A angústia, a aflição, o sofrimento íntimo experimentado pela autora, diferentemente da forma colocada pelos réus, ao meu sentir, não atingiu apenas a esfera do aborrecimento, foi muito mais além. De repente, todas as economias da autora foram colocadas em prol da conquista de um sonho, que era a aquisição de um veículo automotor e os réus obstacularam tal conquista, mediante a imposição de medidas abusivas que afrontam o consagrado Código de Defesa do Consumidor.[...] -
Como evidencia-se, o consorciado tanto pode como deve lutar pelos seus direitos de não apresentar o avalista no ato de sua contemplação por tal cláusula ser abusiva perante o Código de Defesa do Consumidor.
A contemplação deve ser um momento de alegria na vida do consumidor e a preocupação neste ato deve ser relativo apenas a escolha do bem e não sobre as agruras do pós-contemplação.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

CLÁUSULAS ABUSIVAS NO CONTRATO DE CONSÓRCIO POR ADESÃO

Hoje iremos falar sobre a a nulidade das cláusulas contratuais em contrato de adesão para participação em grupo de consórcio.

Trata-se de contrato de adesão onde as cláusulas são dispostas de forma unilateral. Uma vez que não dá a oportunidade ao consumidor de aceitá-las ou não, tendo o mesmo de manifestar o aceite com relação ao todo das normas (cláusulas) predispostas unilateralmente pelo fornecedor do serviço.

Muitas destas cláusulas se demonstram iníquas ou abusivas colocando o consorciado consumidor em extrema desvantagem ao desistir de seu contrato criando redutores aos quais acabam por reduzir ou anular os valores a que tem direito a receber sendo vedado por nosso ordenamento jurídico, senão vejamos:


Nos termos do art. 51, II, do CDC, "São nulas de pleno direto, entre outras, Como  cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: ... subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da serviços, nos casos previstos neste Código".


Deste modo mesmo havendo Circulares do Banco Central (n.° 2766/97 e n.° 3.084/2002) regulamentando e fiscalizando os consórcios, por força da Lei n.° 8.177/91, se essas entrarem em conflito com as determinações do CDC, prevalecem estas últimas, que são de natureza pública econômica. máxime no caso de evidente desequilíbrio contratual.

terça-feira, 2 de junho de 2015

RESTITUIÇÃO DOS VALORES APÓS DESISTÊNCIA DO PLANO DE CONSÓRCIO - CONTRATOS APÓS A LEI 11.795/08

Hoje em matéria quanto a devolução dos valores pagos, após a desistência do consorciado de seu plano, a jurisprudência tem caminhado nos contratos firmados posteriormente a lei 11.795/08 para a restituição imediata dos valores pagos, pois considera demasiadamente oneroso o consorciado ter de aguardar longos anos até o recebimento dos valores, senão vejamos do trecho da sentença em processo que tramita perante a comarca de São Paulo:

Relação: 0221/2015 Teor do ato: O(a) autor(a), qualificado(a) nos autos, ajuizou ação contra a(o) ré(u) alegando, em apertada síntese, que a ré recusa-se a restituir integralmente valores pagos em consórcio que, conforme oferta do representante, teria a cota contemplada. Citada(o), a(o) ré(u) apresentou contestação e alegou que é empresa séria e que não oferece cotas contempladas, e a restituição faz-se na forma do contrato, razão pela qual não há interesse de agir. Réplica a fls. 153/61. É o Relatório. Fundamento e decido. O feito dispensa a produção de outras provas e comporta julgamento antecipado nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. Em nome da boa-fé, presume-se que a ré é empresa séria e idônea. Mas a prática de venda de cota contemplada (ou "poder de influência na contemplação") é tão corriqueira que o defensor do autor não se dá conta do paradoxo de alegá-la em defesa do "vício" da oferta. Não pode o autor fundamentar o vício da oferta no descumprimento de uma condição sabidamente ilegal, porquanto em prejuízo dos demais integrantes do grupo do consórcio. Assim, o pedido de retirada (exclusão) corresponde a inadimplemento culposo do autor, com as cominações legais e contratuais. Quanto à restituição, valor e tempo, registro que perfilhávamos entendimento da restituição antecipada, ponderando a seriedade de algumas administradoras de consórcio. Entrentanto a matéria está pacificada pelo E. Superior Tribunal de Justiça. Assim: Sum 35 STJ - Incide correção monetária sobre as prestações pagas, quando de sua restituição, em virtude da retirada ou exclusão do participante de consórcio; REsp 1114604/PR - As administradoras de consórcio têm liberdade para fixar a respectiva taxa de administração, nos termos do art. 33 da Lei nº 8.177/91 e da Circular nº 2.766/97 do Banco Central, não havendo falar em ilegalidade ou abusividade da taxa contratada superior a 10% (dez por cento), na linha dos precedentes desta Corte Superior de Justiça; REsp 1119300/RS - Para efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil: é devida a restituição de valores vertidos por consorciado desistente ao grupo de consórcio, mas não de imediato, e sim em até trinta dias a contar do prazo previsto contratualmente para o encerramento do plano. A Sum 35 STJ foi estabelecida antes da Lei nº 11.795/08 e, para os contratos celebrados após esta lei, o entendimento do STJ ainda não está pacificado. De outra parte, a Lei estabeleceu uma fórmula para a restituição dos valores pagos pelo excluído: Art. 30 - O consorciado excluído não contemplado terá direito à restituição da importância paga ao fundo comum do grupo, cujo valor deve ser calculado com base no percentual amortizado do valor do bem ou serviço vigente na data da assembleia de contemplação, acrescido dos rendimentos da aplicação financeira a que estão sujeitos os recursos dos consorciados enquanto não utilizados pelo participante, na forma do art. 24, §1º. Enfim, caracterizado o inadimplemento culposo do consorciado, ocorre a exclusão e o excluído tem direito à restituição do fundo comum, calculado conforme acima. A taxa de administração é destacada, não integra o fundo comum. Não há restituição, portanto. Eventuais multas de mora integram fundo comum, na forma do contrato. Mas a multa por exclusão não tem razão de existir. O excluído não deve qualquer multa à administradora ou ao grupo, porquanto a restituição do valor virá apenas ao final, nos termos do art. 31. Assim, as razões do veto aos parágrafos do art. 30: embora o consumidor deva arcar com os prejuízos que trouxer ao grupo de consorciados, conforme § 2o do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, mantê-lo privado de receber os valores vertidos até o final do grupo ou até sua contemplação é absolutamente antijurídico e ofende o princípio da boa-fé, que deve prevalecer em qualquer relação contratual. Do exposto, julgo PROCEDENTE EM PARTE o pedido e extinta a ação, com a solução de mérito, nos termos do art. 269, I, CPC, e condeno a ré a restituir os valores investidos em cotas do consórcio ao fundo comum, deduzida a taxa de administração, valores que deverão ser atualizados com base no percentual do bem amortizado, acrescido dos rendimentos da aplicação financeira a que estão sujeitos os recursos dos consorciados enquanto não utilizados pelo participante, na forma do art. 24, §1º, da Lei nº 11.975/08. Decaindo o réu de parte mínima do pedido, arcará a parte contrária com o pagamento integral das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa desde o ajuizamento, exigíveis apenas nos termos do art. 12 da Lei n° 1.060/50, SE beneficiário da gratuidade. P. R. I. C. Diadema, (Preparo: Ao Estado R$ 576,90). Advogados(s): Joel Barbosa (OAB 128726/SP), Maria Lucilia Gomes (OAB 84206/SP)

Desta forma, acaso seu contrato tenha sido firmado após a edição da lei de consórcio 11.785/08 poderá pleitear em juízo a restituição imediata fundamentando na forma acima.